HISTÓRICO DA COMUNIDADE DO CUMBE – ARACATI -CE

HISTÓRICO DA COMUNIDADE

João Luís Joventino do Nascimento

A comunidade do Cumbe localiza-se no município de Aracati, litoral leste do Ceará e distancia-se 12 km do distrito-sede. O acesso para essa comunidade pode ser feito de duas formas, além do Rio Jaguaribe; uma pelo Distrito-Sede de Aracati, por uma estrada carroçável, e a outra, pelas dunas de Beirada e de Canoa Quebrada (LIMA, 2004).

O Clima da região é semi-árido, apresentando irregularidades pluviométricas temporo-espacial. O regime pluviométrico é do tipo tropical com a estação de chuvas concentradas em cinco meses consecutivos, pois, no litoral, ocorrem chuvas mais abundantes que ultrapassam anualmente 900 a 1000 mm. (SOUZA et al., 2002).

A vegetação predominante na região é de carnaubal e coqueirais, enquanto a vegetação de mangue encontra-se inserida na planície litorânea, ocupando maior parte das planícies fluviomarinhas da região do Baixo Jaguaribe (LIMA, 2004). Carvalho-Neta (2207) cita, como espécies de mangue encontradas na região, a Rhizophora mangle, Avicennia shaueriana e Avicennia germinans, Laguncularia racemosa e Conocarpus erectus.

Cumbe é uma palavra de origem africana ou afrobrasileira que significa quilombo. É uma comunidade tradicional não-indígena representada pelos pescadores artesanais.
A população é composta por famílias de pescadores/as, agricultores/as e artesãos/ãs, com aproximadamente 576 pessoas, entre crianças, jovens, adultos e idosos, distribuídos/as em 135 famílias e correspondendo a 0,86% da população total do município de Aracati (66.384 habitantes) (QUEIROZ, 2007).

A comunidade é grande produtora de produtos agrícolas como coco e manga; pescados caranguejos, camarão e peixes; mariscos sururu, intam e ostras, artesanato de raízes e labirinto. Nas manifestações culturais destaca-se a festa do padroeiro Nosso Senhor do Bonfim, as quadrilhas e os Calungas do Cumbe. Na culinária destaca-se a galinha caipira, a caranguejada, os pirão de peixes e as mariscadas.

“A história do Sítio Cumbe nos revela, assim, que as marcas não são somente materiais, as representações simbólicas se manifestam como parte essencial integrante das relações materiais da sociedade local com a natureza” (QUEIROZ, 2007, p. 24).

No Cumbe, de acordo com o relatório dos Estudos Arqueológicos na área de intervenção das usinas de energia eólicas, no município de Aracati – Ceará, no local de instalação dessas usinas, foram identificadas 71 ocorrências de interesse arqueológico, representadas por vestígios dos períodos pré-histórico e histórico, relacionados a ocupações de grupos mar isqueiros-coletores-caçadores, como vestígios de atividades de consumo alimentar, tais como instrumentos de coleta, preparo, acondicionamento e consumo de alimentos, além de restos alimentares, como conchas de bivalves (ostras) e gastrópodes, que podem ser encontrados dispersos ou em concentrações expressivas situadas em pequenas elevações dunares (domos). Ali, durante o período que compreendeu o final do século XVI ao final do século XVII, os índios Potiguar (Tupi) e Paiacu (Tapuia) estiveram presentes no baixo Jaguaribe (VIANA & JUNIOR, 2008).

A identificação de instrumentos como mãos-de-mó, almofarizes, lãminas de machados polidos e batedores (VIANA & JUNIOR, 2008) demonstra que esses grupos tinham hábito alimentar diverso, desde frutos, grãos, raízes, até peixes, carnes, moluscos etc.
Segundo o historiador Antônio Bezerra (1901), havia muitos engenhos, na cidade de Aracati, produzindo aguardente. Estes engenhos encontravam à margem direita do Rio Jaguaribe, na localidade do Cumbe e em localidades vizinhas. Era afamada no Ceará inteiro a cachaça produzida no Cumbe, tinha doze engenhos trabalhando dia e noite na fabricação da cachaça e rapadura.
Nos registros da Comissão Científica de Exploração da Província do Ceará, em 1859, existem relatos sobre a primeira vez que os moinhos de vento dos engenhos do Cumbe foram avistados. Eles eram feitos de carnaúba e serviam para irrigar as plantações, retirando água do subsolo, o que chamou bastante atenção devido à tecnologia simples que não era difundida na Província, nem em outra parte do território nacional, somente foi incorporada em outras localidades com o tempo (BRAGA, 1982; 2004).

De acordo com as “Notas sobre a Vila de Aracati”, de 29 de agosto a 14 de setembro de 1859, de Francisco Freire Alemão, o chefe da seção de Botânica da Comissão, “não há passeio, o único é o afamado Cumbe” ( FREIRE-ALEMÃO, 2006). Além disso, há relatos sobre a fábrica de sabão, velas e licores do Cumbe, de um espanhol.

De acordo com Lima (1956, p. 10-12), nos morros do Cumbe e da Beirada “ouvem-se, de tempos em tempos, fortes estrondos e ruídos confusos, acompanhados de ebulição e deslocamento das areias”. Ainda segundo o autor, os moradores do Cumbe acreditam que, “no morro do Cumbe, está encantado El Rei de Portugual D. Sebastião com os seus soldados e que, em certos dias, principalmente nas noites de luar, ao som de seus tambores de guerra, sai passeando pelas encostas do morro, acompanhado de sua tropa”.

Em 1889, o Jornal “O Jaguaribe” registra a qualidade de vida dos donos de engenhos, quando o proprietário de um, o Senhor Abel Francisco Lopes hospedou uma comitiva formada por personalidades ilustres do Aracati, e o mesmo Abel Francisco Lopes manda ergue no morro mais alto do Cumbe, uma cruz de dez metros de altura toda de aroeira para marcar a passagem do século XIX, onde se pode ser vista de toda região.
A comunidade do Cumbe é quem abastece o município de Aracati a mais de 30 anos com água que sai do seu campo de dunas.

Nos últimos anos, a comunidade vem sofrendo com a chegada de grandes projetos como a CAGECE, a carcinicultura e a instalação de parques de energia eólica, o que vem trazendo sérios problemas socioambientais, desde o desmatamento do mangue, poluição das águas, mortandade da fauna e flora local, privatização das áreas públicas, aterramento de lagoas interdunares, destruição de sítios arqueológicos, compactação de dunas móveis, mudança na dinâmica local, desrespeito a modo de vida tradicional como a relação da população com essas áreas o que chamamos de negação de direitos e racismo ambiental.

Comentários

Aracati em Foco disse…
Excelente!
Parabéns e ja reproduzi em meu blog Aracati em Foco.

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