A INVERSÃO DO CARNAVAL DA VIDA

A INVERSÃO DO CARNAVAL DA VIDA O carnaval para os/as brasileiros/as é, reconhecidamente, o festejo das inversões. O período de celebrar o que muitas vezes nem sequer merece menção, o momento no qual desempregados trabalham assiduamente e funcionários assíduos farreiam sem o remorso de uma segunda-feira, onde rico se traja de povo e o povo, na extremada limitação de suas possibilidades, esbanja luxuosidade. Por quatro dias a realidade é destituída pelo reino da fantasia e a mentira é deliberadamente decretada como impulsionadora da alegria. Para os 361 dias restantes do ano, no entanto, a carruagem é só um jerimum sem rodas. A inversão é desinvertida, torna-se versão de fatos reais e nada animadores para a maior parte dos/as ex-foliões/ãs. Aracati pode ilustrar bem o que é essa tal inversão carnavalesca. Durante 361 dias do ano seu povo sofre com ruas e estradas esburacadas e sujas, falta de iluminação pública, lama farta e muitos percursos intransitáveis na zona rural quando do período chuvoso, fechamento de escolas, defasagem no sistema público de saúde, poluição da natureza por grandes empresas, sobretudo as criadoras de camarão, risco de total destruição da vida comunitária tradicional e de históricos acervos ancestrais e naturais pela instalação suja de parques de energia eólica, sufocamento dos gritos populares pela promessa politiqueira, etc, etc. Ao se aproximar o carnaval, pelo que se apresenta ano a ano, a fábula é então contada, a cidade começa a fantasiar-se para a festa com a troca de luminárias defeituosas, as ruas nas imediações do “corredor encantado” são limpas, até o meio fio de calçadas e canteiros são pintados com cal, e também o tronco de algumas árvores, na avenida da folia não há buracos, trios elétricos são contratados para que o povo sofrido finalmente dê vazão a seus clamores contidos. A união de toda gente é constatada ali, no corredor da folia, de frente aos camarotes, para que as autoridades se certifiquem de seu êxito político, de sua estratégia nada fantasiosa de contenção da luta da população oprimida. Nada contra a cultura carnavalesca, mas bem que o povo poderia ir além nas suas fantasias e no período de sua vigência. Já pensou mesa farta e todas as estradas limpas e sem buracos? Como seria celebrar a conquista de uma comunidade sem carcinicultura? E uma energia limpa que servisse ao povo e não precisasse privatizar praias e dunas, já imaginou? Já imaginou escolas sendo abertas e não fechadas? Professores em condições dignas de trabalho, com um número adequado de educandos por turma e recebendo de acordo com parâmetros decentes? Como será que é ter hospitais funcionando? Já tentou imaginar todo o dinheiro amontoado com os impostos pagos pelo povo trabalhador estando agora à disposição para melhoria da vida desse mesmo povo? E isso durante o ano inteiro e por toda vida? A elite que ficasse com o seu carnaval mixuruca de apenas meia semana, pois o povo certamente celebraria durante os 365 dias do ano. Ao que tudo indica, entretanto, sonhos dessa envergadura não são realizáveis via eleitoral. Aliás, processo eleitoral confiável hoje em dia só mesmo para rei momo e rainha do carnaval. A política da fantasia nos cobra consciência na hora de votar, quando na verdade votar já deixou de ser um ato consciente. Nenhum sobrevivente do povo, tenhamos absoluta certeza, legitima, por lucidez, uma política que permite aos ricos tudo que desejarem e aos pobres somente o destino de ficarem mais pobres. Por isso a política do povo deve ser aquela que ganha as ruas, que ocupa órgão público e só sai com a reivindicação garantida, que bota empresa poluidora e desrespeitadora dos direitos pra correr. A política do povo deve ser uma política que uma o povo e não o separe, isso não só de dois em dois anos, mas todos os dias. Os poderosos continuam tramando contra essa política, pois que agora tremam só de imaginar a iminência de sua concretização. Pode me chamar de sonhador. Não tem problema. Mas lembre-se do que disse o poeta: “Sonho que se sonha só é só um sonho que se sonha só. Sonho que se sonha junto é realidade.” Vamos lá, povo trabalhador! Ganhemos as ruas! Invertamos a lógica dessa vida invertida! Construamos o nosso poder, o poder popular! Thales Emmanuel OPA – Organização Popular Aracati

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